Endocanabinoides são os analgésicos do corpo


Distribuição dos receptores canabinoides; A: Supra-espinal, Espinal e periférica (CNS- Sistema nervoso central); B: Tálamo, responsável pela sensação de dor; D: Neuropático (dor) e inflamatória (dor).
Uma introdução ao sistema endocanabinoide
Desde a impactante identificação dos receptores canabinoides (CB1 em 1990 e CB2 em 1993), aparentava-se evidente de que nosso corpo produzia ligantes (substâncias que se ligam aos receptores) naturais a esses dois receptores [1,2].
N-aracdonil etanolamida foi o primeiro composto descoberto que se ligava fortemente ao receptor CB1. Atualmente, este receptor é conhecido como Anandamida (AEA), do sânscrito “bênção eterna”.
Há apenas alguns anos, um composto irmão foi caracterizado, capaz de se ligar a ambos os receptores, CB1 e CB2. Foi chamado 2-aracdonilglicerol (2-AG).
2-AG e AEA são, respectivamente, um éster e uma amida, da família dos ácidos graxos poli-insaturados; São estruturalmente similares ao conhecido Δ9-tetrahidrocanabinol (Δ9-THC), sendo que os três ativam o CB1 e o CB2 de maneira não específica, além do inovador receptor canabinoide GPR55, identificado recentemente, mas diferentes deste último, uma vez que o CB1 e o CB2 são “endógenos” em nossos corpos, sendo então endocanabinoides (ECs) [5].
A prevalência dos receptores canabinoides, tanto no cérebro e nos nervos periféricos e incrivelmente densa e variada, contribuindo, portanto, para o amplo perfil terapêutico dos medicamentos à base de Cannabis [3].
O receptor CB1 é expressado no tecido nervoso, tanto centralmente quanto perifericamente, bem como outros órgãos periféricos. Receptores CB1 estão presentes em menor quantidade no coração, pulmão, testículos, ovários, medula óssea, timo, útero e células imunes [6].
Receptores CB2 são majoritariamente expressados nos tecidos do sistema imune, incluindo macrófagos, mastócitos e baço. Sua presença no sistema nervoso central e majoritariamente localizada na medula espinhal [8].
Analgesia e os Endocanabinoides
Os receptores CB1 são localizados principalmente nas regiões envolvidas na transmissão e modulação da dor, como o gânglio da raiz dorsal (DRG), medula espinhal, tálamo, massa cinzenta periaquedutal (PAG), amígdala e medula rostroventromedial [7].
Receptores CB2 também estão presentes na pele e sua ativação é relatada como liberadora de endorfinas de queratinócitos, agindo via receptores μ opioides, produzindo analgesia [9].
É bem fundamentado que a ativação do sistema EC reduz a sensação de dor em níveis periferias e centrais. Numerosas evidências mostram que a AEA e a 2-AG induzem a analgesia [10].
Após ferimentos ao corpo, os níveis de endocanabinoides aumentam, tanto no local do ferimento, quanto nas vias descendentes da dor. Essa reação a primeira reação analgésica do corpo: Ela sintetiza mais endocanabinoides, criando dois efeitos:
Inibindo a condução das terminações nervosas da sensação de dor.
Sinalizando mediadores anti-inflamatórios, reduzindo o dano no local.
Observações finais
O sistema canabinoides induz efeitos analgésicos via múltiplos mecanismos, envolvendo outras vias, como os receptores opioides, vaniloides, adrenérgicos e as prostaglandinas. Induzir suas ativações, tanto aumentando a liberação dos endocanabinoides quanto inibindo as enzimas que degradam esses endocanabinoides, beneficiam condições relacionadas a dor.
Dor aguda, pós-operatória, crônica (assim como Esclerose Múltipla), Neuropática, relacionadas ao câncer, fibromialgia, Enxaqueca, espasticidade, síndrome do membro fantasma são apenas algumas condições onde os tratamentos com canabinoides provaram ser mais efetivas que os tratamentos disponíveis atualmente, como opioides e drogas anti-inflamatórias.
Pesquisas básicas em como os receptores canabinoides e os endocanabinoides intervêm nos mecanismos de dor está progredindo rapidamente. O progresso clínico, no entanto, avança lentamente. Uma das desvantagens em investigar canabinoides e a tipificação destes como substâncias de abuso.
Nosso entendimento atual de fisiologia e farmacologia do sistema endocanabinoide motivou o desenvolvimento de drogas terapêuticas a base de Cannabis, onde tentativas têm sido feitas para sintetizar compostos com as ações terapêuticas desejadas, sem os efeitos adversos psicoativos.
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Referências
1) Freund, T Katona, I Piomelli, D. (2003). Role of Endogenous Cannabinoids in Synaptic Signaling. Physical Rev. 83 (10), 1017-1066.
2) Skaper SD, Di Marzo V. (2012). Endocannabinoids in nervous system health and disease: the big picture in a nutshell. Philos Trans R Soc Lond B Biol Sci. 367 (1607), 3193-3200.
3) Hazekamp, A (2013). An introduction to medical Cannabis. Leiden: Self-published. 21-24.
4) Ross, R A. (2003). Review Anandamide and vanilloid TRPV1 receptors. Br J Pharmacol. 140 (5), 790-801.
5) Petrosino, S Ligresti, A Di Marzo, V. (2009). Endocannabinoid chemical biology: a tool for the development of novel therapies. Current Opinion in Chemical Biology. 13 (3), 309–320
6) Galiegue S, Mary S, Marchand J, Dussossoy D, Carriere D, Carayon P, Bouaboula M, Shire D, Le Fur G, Casellas P: Expression of central and peripheral cannabinoid receptors in human immune tissues and leukocyte subpopulations. Eur J Biochem 1995, 232:54-61.
7) Tsou K, Brown S, Sanudo-Pena MC, Mackie K, Walker JM: Immunohistochemical distribution of cannabinoid CB1 receptors in the rat central nervous system. Neuroscience 1998, 83:393-411
8) Beltramo M, Bernardini N, Bertorelli R, Campanella M, Nicolussi E, Fredduzzi S, Reggiani A: CB2 receptor-mediated antihyperalgesia: possible direct involvement of neural mechanisms. Eur J Neurosci 2006, 23:1530-1538.
9) Ibrahim MM, Porreca F, Lai J, Albrecht PJ, Rice FL, Khodorova A, Davar G, Makriyannis A, Vanderah TW, Mata HP, Malan TP Jr: CB2 cannabinoid receptor activation produces antinociception by stimulating peripheral release of endogenous opioids. Proc Natl Acad Sci USA 2005, 102:3093-3098
10) Pertwee RG: Cannabinoid receptors and pain. Prog Neurobiol 2001, 63:569-611
Tradução: André Osava